terça-feira, dezembro 23, 2025

É a economia, imbecis!

Há verdades incómodas que insistem em sobreviver a governos, programas eleitorais e conferências de imprensa. Uma delas é a lei da oferta e da procura. Outra é que ignorá-la não a faz desaparecer — apenas torna os resultados mais caros. Ainda assim, a política de habitação em Portugal parece empenhada em testar até onde vai a paciência da economia.

O atual Governo decidiu enfrentar o problema dos preços da habitação com uma estratégia engenhosa: facilitar a compra de casas esperando que isso as torne mais baratas. Para tal, isentou jovens do IMT e do Imposto do Selo e acrescentou uma garantia pública de até 15% do valor do crédito à habitação. A ideia implícita parece ser a de que, se mais pessoas conseguirem comprar casa, então — por algum mecanismo místico ainda não descrito em manuais de economia — os preços acabarão por cair.

A economia, ingrata como sempre, recusou colaborar.

Num mercado onde a oferta de habitação é estruturalmente escassa e reage lentamente, reduzir impostos sobre a compra não torna as casas mais acessíveis; torna os compradores capazes de pagar mais por elas. O resultado não é uma descida de preços, mas sim a sua adaptação ascendente. O subsídio não desaparece: é incorporado no preço. O jovem agradece, o vendedor agradece ainda mais, e o mercado segue imperturbável.

Esta conclusão não é fruto de cinismo ideológico, mas de evidência empírica. Um estudo citado pelo jornal Público mostra que a poupança proporcionada pela isenção de IMT é totalmente absorvida pela subida dos preços em poucos meses — três a quatro meses nos imóveis mais baratos, cerca de quinze meses nos mais caros. Ou seja, o Estado alivia o jovem hoje para que o mercado lhe cobre amanhã, com juros implícitos.

O mais fascinante nesta abordagem é a insistência em tratar um problema de escassez de oferta como se fosse um problema de falta de procura. Em vez de construir mais, libertar solo urbano, reformar seriamente o licenciamento ou investir de forma consistente em habitação pública, opta-se por tornar o crédito mais fácil e os impostos mais baixos. É como tentar baixar o preço dos bilhetes para um concerto esgotado… oferecendo cartões de crédito a quem ainda está na fila.

Há ainda a ironia suprema: estas medidas são apresentadas como combate à especulação. Na prática, fazem exatamente o contrário. Aumentam a concorrência entre compradores, reforçam expectativas de preços mais elevados e sinalizam ao mercado que o Estado está disponível para apoiar a procura sempre que os preços sobem — uma garantia implícita que qualquer especulador entende perfeitamente.

Nada disto significa que apoiar jovens seja errado. Significa apenas que subsidiar a procura não é política de controlo de preços. É política de redistribuição disfarçada, frequentemente regressiva, e quase sempre ineficaz num mercado rígido. Ajuda alguns a entrar hoje, empurra outros para fora amanhã, e não resolve o problema central: há poucas casas para muitas pessoas.

No fim, a lei da oferta e da procura mantém-se teimosamente intacta, apesar dos comunicados de imprensa. E a habitação em Portugal continua extremamente cara não porque a economia falhou, mas porque se insiste em legislar como se ela não existisse.

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