terça-feira, novembro 20, 2007

É por estas e por outras que hoje em dia não acredito em santas de altar nem em machões que se auto-intitulam de barba rija

Um amigo ao contar-me a sua última aventura fez-me dissertar uma vez mais sobre o tema da perversão. Ele sempre foi extremamente liberal a nível sexual e por isso tento previamente preparar a minha “psico” para o que me vai contar nos minutos seguintes. No entanto, em um ou outro pormenor, acaba sempre por me surpreender. Parece que desta vez não fui o único.
Envolveu-se num curioso jogo de submissão. Ele dominador, o outro o dominado. Todas as regras foram estipuladas previamente no messenger. Pediu, perdão, exigiu ao outro que aparecesse à porta de sua casa vendado e trazendo um (“excitante”) fio dental como roupa interior. Nem passou uma hora até o outro aparecer-lhe em casa naqueles propósitos. Ficou surpreendido, mesmo sabendo antecipadamente todas as características de quem estava naquele momento à sua frente: muito bem constituído fisicamente, que justificaria a sua função de um cargo razoavelmente prestigiado no exército nacional e a transpirar masculinidade por todos os poros - e parece que eram mesmo muitos, dado os seus mais de um metro e noventa de altura. Não houve troca de quaisquer palavras. O submisso deixou-se conduzir até ao quarto pelo seu mestre. Despem-se. O meu amigo toma imediatamente a decisão de colocar um preservativo ao reparar que o outro já estava “de quatro”, só com a tal lingerie vestida, em cima da sua cama, disposto veementemente a fazer honrar o seu compromisso. Os preliminares (ou quaisquer outro tipo de preparativos) não estavam nas regras, o “senhor militar” também assim preferiu. Consta que no início ainda se ouviu uns grunhidos agudos de dor, mas parece que o homem aguentou-se bem às primeiras investidas.Território conquistado e já suplicava por mais. O entusiasmo da vitória atingiu o nível hardcoresco de um “arrebenta-me as entranhas”! Sim... Utilizava uns nomes menos próprios. Não de serem exclamados em momentos de grande excitação como aquele, mas soavam no mínimo estranho ao serem proclamados por um senhor com uma voz muito grossa, um “senhor militar”, chefe de família, pai de filhos e por aí a fora. Foi então essa a segunda surpresa, a fantasia do “sargento submisso”, chegou ao ponto de trocar os nomes dos seus órgãos sexuais. Então, por sua legítima vontade: o seu ânus passou naquele momento a ser uma potentíssima vagina insaciável - peço desculpa, por qualquer coisinha, mas é a minha melhor tradução “soft” possível da designação relatada. Do que conheço do meu amigo, tal não é coisa para causar-lhe grandes amassos na consciência, por isso perseguiram como se não houvesse amanhã - sobretudo como se não houvesse um passado castrador por explicar -, até quase ao fim do mundo, mas não até ao fim do jogo. Porque este só terminou, quando o meu amigo exigiu que o outro se metesse, em dois segundos, fora de sua casa, mas tal não aconteceu sem antes de ele ter estado sentado no sofá durante mais de 5 minutos, a fumar um cigarro, enquanto que o seu servo se mantinha de coqueras, no centro da sala, a servir de apoio para as suas pernas. Perguntei-lhe com um ar trocista: “Foi ideia tua?”, o meu amigo franziu a testa. “Achas?!”. O que perfez a sua terceira surpresa daquele final de tarde.

Foi no preciso momento em que o seu “partner do jogo”, depois do acto (bem) consumado, se ter colocado de joelhos à sua frente (sem que ele tenha dado tal ordem) que o meu amigo percebeu que tinha acabado de participar em algo que transcendia a concretização de uma simples fantasia ou de uma mera brincadeira entre dois adultos.
Não tenho certezas absolutas sobre a minha própria sexualidade quanto mais de alguém que não conheço. Nem nunca conseguirei provar que desejos reprimidos e alguns estigmas e preconceitos por resolver podem resultar numa mistura explosiva na constituição da personalidade de qualquer indivíduo. Mas sei, por mim e por quem me já foi dado a conhecer, que a sexualidade humana vai muito para além das duas ou três designações estereotipadas que a ciência e a sociedade pediram para nos encaixarmos e que nada disto até nem traria grande mal ao mundo se tal obrigatoriedade, não provocasse, em certas pessoas, uma perversão sem limites. E sem retorno.

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