Não há muito
tempo, entrei numa casa de banho pública de um conhecido “mega” espaço
comercial em Viseu. Dirijo-me a um dos urinóis. Entretanto entram três homens
(dois deles mantinham um animado diálogo) e preenchem cada uma das cabines
individuais.
Todos entramos
naquele espaço público com o mesmo objectivo: urinar, mas todos tinhamos (pelo
menos) a consciência de que há, naquele lugar, todo um “novo mundo” que anda a
ser explorado, para além daquela necessidade fisiológica. Daí que os outros
homens tenham optado pela privacidade dos cubículos... Como uma ampla casa de
banho pode ser tão minúscula para quatro homens.
António da Silva,
um cineasta português radicado em Inglaterra, apresenta este fim de semana a
sua mais recente obra no Festival Queer Lisboa: Bankers.
Uma câmara
escondida revela sequências reais de engate entre bancários numa casa-de-banho
pública londrina. Ou como escreve Vasco Câmara do Público: “é uma coreografia à volta do urinol depois do almoço... António preocupa-se em transcender a pornografia, mas o interesse dos seus filmes é também o de estar num limbo entre a sujidade e a limpeza, entre a caução de objecto “artísico” e a condição de peep show privado.”. Ou como diz o
realizador: “é um trabalho de pura observação... Mas observar também como as pessoas urinam, os gestos dos homens com os seus pénis, cada com a sua forma de fazer…”.
Confrontado com a
questão da promiscuidade, li numa outra entrevista uma resposta sua que
considero ainda mais interessante: “Não me importo de ser visto como o realizador que filma a promiscuidade gay. Mas nos próximos dois/três anos vão haver muitos mais a fazerem o que eu faço e espero que nessa altura as pessoas consigam ter uma perspectiva mais construtiva em relação à palavra “promiscuidade”.” De facto, já é tempo de termos uma visão menos crítica e mais
interpretativa deste termo. Como por exemplo, tentar entender as causas deste
fenómeno.
A ideia de que a
maioria destes homens, que se auto-classificam sem hesitações de
heterosexuais (as alianças nos dedos estão lá para não enganar ninguém), e que fazem do engate circunstancial com outros homens, em WC
públicos, o seu passatempo favorito, também vem ao encontro de que a teoria das
catalogações (ou orientações sexuais) não passa disso mesmo: uma teoria.
Homossexuais, heterossexuais, bissexuais - o problema está no prefixo. Pois no
fundo, naqueles recantos dos urinóis, e ao contrário do que os outros e,
sobretudo, do próprio, possam pensar, só há ali homens sexuais. Um primo
afastado do Australopiteco, que desceu das árvores, sedentarizou-se, constituiu
família, vestiu fato e gravata e até já gere investimentos de milhões, mas
continua a “brincar” com a pilinha dos outros como antes. Há características
demasiado congénitas à espécie para sofrerem qualquer mutação.
(“Bankers”
passa dia 23 de Setembro, às 23h59, na Sala Manoel de Oliveira, e dia 27 de
Setembro, às 23h30, na Sala 3 do Cinema São Jorge, ou pode ser visto online em qualquer altura, mediante o pagamento de um donativo na sua página oficial.)
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