Uma quase-tragédia desencadeia uma série de questões no
seio de uma família aparentemente equilibrada. Até esse momento vivia-se pacatamente
umas férias de neve e uma relação mais ou menos controlada. Até ao momento em
que o casal é confrontado com esse súbito descontrolo – como uma avalanche - e, ao depararem-se com os instintos de
sobrevivência da sua cara-metade, surgem as divergências, as desconfianças e as
inseguranças.
Mais do que realçar as diferenças entre sexos em situação
de crise/acidente, o realizador sueco Ruben Östlund manobrou com mestria, neste
seu “Force Majeure”, as suas duas principais personagens no sentido de
demonstrar que qualquer uma delas (ou qualquer um de nós) pode ser vítima dos
seus próprios instintos. Será por isso que todas as personagens deste filme (e
os seus telespectadores), quase no final, são levados para dentro de um autocarro,
que vai circulando, desastrosamente, à beira do abismo. É o derradeiro teste
aos instintos primários de todos ou, talvez, para que questionemo-nos de quanto
eles (os instintos) devem ser representativos daquilo que realmente somos.
Para reforçar o ambiente gélido e angustiante vivido
dentro de portas, no quarto da estância de ski, Östlund mostra também imagens
do exterior (excelente fotografia – é uma das razões que faz com que nunca nos
queixemos de um certo abuso dos planos fixos), ao som dos pungentes violinos de
“Le Quattro Stagioni, L'Estate” de Vivaldi.
Um filme incrível e um retrato inteligentíssimo da mente
humana. De longe, o melhor que vi da colheita de 2014... (E sim, eu também vi todas
as propostas “indie” americanas: Boyhood, Birdman, The Grand Budapest Hotel, etc.)