segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Kinsey II

“Entre os chimpanzés pigmeus, o primata mais próximo de nós, é o sexo que cimenta a paz e a coesão social. Liberto de noções de amor romântico, de religião, de moralidade, a sociedade deles mantém-se, como unidade coerente de condicionamento biológico. (...)
Segundo as experiências de mulheres que deram a sua contribuição, notamos uma variada motivação para o coito extraconjugal. Por vezes é uma tentativa consciente ou não de subir socialmente. Noutras proporciona-lhes uma variedade de experiências com parceiros sexuais mais viris que os cônjuges. Há alturas em que é praticado como retaliação por relações extra-matrimoniais do cônjuge. Certas mulheres descobrem novas fontes de satisfação emocional enquanto para outras é impossível partilhar uma relação tão íntima com mais de um parceiro.
Existe também um considerável número de casos em que são os próprios maridos a encorajá-las a variar, para que elas gozem de um adicional prazer sexual.”

Alfred C. Kinsey

Em Nova Iorque quando Kinsey preparava-se para entrevistar todo o elenco de “Um eléctrico chamado desejo” e promover um segundo livro dedicado exclusivamente à sexualidade feminina, confrontado com alguns jornalistas que o esperavam no Aeroporto disse:
“Se querem escrever sobre uma coisa com utilidade estudem as leis relacionadas com as ofensas sexuais; a maioria dos criminosos presos não tem nada no seu historial que se diferencie do resto da população, o seu único crime é não terem dinheiro para pagar um bom advogado. E é injusto: o pecado que todos cometem deixa de o ser e o crime cometido por todos deixa de o ser (it’s unfair: everybody sin is nobody sin and everybody crime isn’t crime at all)!”
Não foi tanto o facto de se ter revelado que as mulheres americanas, afinal, tinham uma vida sexual própria e independente da vontade masculina, mas foram acima de tudo estas últimas palavras, que acabaram por sair nas primeiras páginas dos jornais, que pôs termo à ligação Kinsey - Fundação Rockefeller.
O nosso polémico cientista começou a trabalhar por conta própria mas nunca desistiu das suas pesquisas e entrevistas.

Um dos homens mais controversos que Kinsey entrevistou, admitia que mantinha relações sexuais com menores e durante a descrição dos seus actos, um dos seus assistentes que o acompanhava, revoltadíssimo, saiu da sala. No filme “Relatório Kinsey” relata-se o diálogo que perseguiu entre o pedólilo (P) e Kinsey (K).
P - Pensei que os tinha ensinado a ser imparciais?
K - Às vezes isso é difícil.
P - Alguém como eu deve provar o que o senhor acredita?
K - Como?
P - Que toda a gente deve poder fazer o que quer.
K - Nunca disse isso. Ninguém deve fazer nada contra vontade, ou ser magoado.
P - É muito mais convencional do que eu pensei...

Eu, hoje, divido-me entre vergar-me perante este grande senhor e as suas palavras e uma nova realidade sexual. Estou convicto de que o desfasamento de ideias e princípios entre as pessoas, em tudo o que toca à sexualidade, é cada vez maior. Neste momento, num mesmo planeta, continuam a existir os mais conservadores que até estes estudos dos finais dos anos 40 do século passado são difíceis de digerir, que convivem abertamente (ou não) com outros, para o qual o sexo é livre e não deve ter qualquer tipo de tabus. Consta que é a moralidade que os separa e eu sempre pensei que nestas coisas do sexo, quem mandava era o desejo e o prazer, sempre vigiados pela razão e pelo coração (claro).
Estamos então num novo século e já quase nada no plano sexual é proibido. Para quem acredita nisto, como eu, agora o desafio será mais de nos mantermos nós próprios no meio desta espécie de “anarquia sexual” (chamem-me "convencional"!). Seria com isto que Kinsey teria que se confrontar e de ter em consideração nos seus estudos, se ainda andasse por cá a investigar o que andamos a fazer na nossa intimidade.

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