segunda-feira, julho 09, 2007

Os falsos individualistas

Ora aqui se apresenta um exemplo de como uma bela ideia pode-se transformar num belo disparate. A reportagem até parte de um pressuposto muito interessante: dar a conhecer melhor os individualistas numa sociedade que sempre teve uma grande tradição em princípios colectivos, como é a nossa.
Na última edição da revista “Sábado” pode-se ler um artigo intitulado “Mais vale só que acompanhado” que retrata a vida de quatro portugueses (auto-)denominados “individualistas”. A Célia, de 32 anos, administrativa, é a primeira a ser abordada e diz que adora ir jantar fora, ir ao cinema e ir à praia... sozinha! Confessa que tem amigos mas que “recusa imensos convites porque quando estou só, muita coisa pode acontecer”, continua: “é incrível como os rapazes se metem com uma rapariga que encontram sozinha”. Humm... Lamentavelmente vou ter que ser eu a transmitir a novidade à Sra. Jornalista da “Sábado” e à própria Célia: isto não é individualismo, é uma manobra de engate. Batidíssima, diga-se de passagem.
Fiquei com esperanças de que os próximos casos apresentados dessem um bom contributo do que é ser individualista em Portugal mas, antes pelo contrário, são ainda piores! O próximo testemunho diz que só gosta de fazer surf (e pouco mais) sozinho, “para o resto prefere ter companhia”. Ok. Mas qual era a ideia oposta? Levar a namorada, a passear, na ponta da prancha? Seguinte! A senhora “secretária” de 46 anos diz que adora fazer grandes jantaradas para os amigos mas que desistiu de ir ao cinema acompanhada, pois “detesta conversas durante os filmes”. Eu agradeço profundamente o seu acto cívico, mas tal por si só não faz desta senhora uma individualista por natureza. Por fim, o “estudante” de 25 anos diz que viaja muito e sempre sozinho e que nos locais que visita acaba sempre por conhecer futuros amigos. “Quando se está sozinho, as pessoas aproximam-se mais”. É verdade, e por falar nisso, já conhece a Célia?
Um individualista não é, de todo, um solitário mas há que esclarecer o seguinte: as pessoas estão mais autónomas é um facto – positivo, na minha modesta opinião - mas isso não chega para alcançarmos uma definição perfeita de individualismo e muito menos quando se baseia, unicamente, num acto isolado. Por essa lógica, imaginemos que estávamos numa amena cavaqueira com o nosso grupo de amigos num bar e nos dava aquele “apertozinho na bexiga”, ao mesmo tempo que dizíamos que íamos “só ali ao privado”, automaticamente recairia sobre nós a acusação de sermos uns “grandessíssimos individualistas incontinentes”, ou qualquer coisa parecida.

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