Na continuação da minha aventura por lugares recônditos e (semi)abandonados, optei desta vez por ir em busca de um local menos oculto e mais próximo das minhas origens. Já há algum tempo que tinha reparado naquela enigmática casa no ermo de uma das colinas opostas à Serra de Montejunto, não muito distante da zona onde passei os primeiros dezoito anos da minha vida. Sempre que passava por um certo ponto de uma das estradas que me levavam à minha terra, alguns dos meus sentidos desligavam-se automaticamente por segundos da condução e dirigiam-se até aquela casa.
Recentemente confirmei com familiares de que ela se encontrava abandonada e, inclusive, que ninguém consegue indicar com precisão qual foi a última família a habitá-la. Todos estes dados adensaram a minha curiosidade e fortaleceram a vontade de fazer-lhe uma visita.
Foi relativamente fácil descobrir qual dos vários caminhos que trepam por aquela colina acima dariam acesso à casa e por isso deixei o carro na berma mais larga e mais próxima do meu "ponto de partida". Já nesse local e nos primeiros metros da subida não é possível observar a casa, mas as demarcações do caminho parecem indicar que ele é o correcto. Pela altura da vegetação apercebo-me também que há muito tempo que não circula por aqui qualquer veículo a motor - se é que algum dia terá circulado. Alguns metros mais acima consigo ver o meu carro e noto que o caminho até à casa passa a ser recto e sem as curvas do percurso anterior.
A poucos metros da casa já é possível confirmar a sua opulência, é surpreendentemente maior que aquela imagem que a minha observação à distância foi construindo ao longo dos últimos tempos. Ainda assim há que descontar toda a vegetação que a rodeia e a invade lentamente ao longo das suas paredes.
Ao contorná-la pelo seu lado poente, esboço um sorriso ao verificar que uma das suas entradas encontra-se desbloqueada, o que muito facilita a minha vontade de explorar o seu interior. Mas continuo a subir e só paro no momento em que é possível contemplar toda a casa e a paisagem envolvente. Posso garantir que só este momento, vale mil subidas ao local.
A citada entrada dá acesso a uma espécie de anexo da casa. Pode ter sido uma adega, pode ter sido um curral, seja o que terá sido, vejo que permite o acesso ao piso superior da parte habitacional e isso dá-me a satisfação de poder continuar a aventura. Também constato que recentemente parece ter sido abrigo de alguém. Há uma casota improvisada para um cão, há metade de um garrafão, improvisado como seu bebedouro, uma corrente... E há muitas penas espalhadas pelo chão.
Numa superfície mais elevada encontro algo que explica a depenação: uma telha com algo que parece-me ser restos de carne, de aves… Opto por não pensar muito sobre este estranho facto e subo para o patamar superior.
O primeiro andar da casa é sobretudo composto por dois grandes quartos, onde é possível contemplar, pelas suas grandes e velhas janelas, a Serra de Montejunto em toda a sua extensão. O soalho de um dos quartos está repleto de esponja de um colchão em elevado estado de decomposição. Também nele está a prova das marcas do tempo e da chuva que vai entrando por aqueles espaços abertos para a Serra, que um dia foram janelas.
Igualmente fazendo parte do piso superior encontro a única assoalhada que já se encontra sem qualquer cobertura e onde a vegetação é rainha. É também por aqui que se encontra o acesso (interior) ao piso inferior da parte habitável. A escuridão quase infinita da escadaria intimida-me. Falta-me uma lanterna para prosseguir... Ou mais coragem? Decido sair e continuar a explorar a parte leste da casa.
Para além de mais vegetação selvagem que galga paredes acima, encontro a única porta deste lado da habitação. A quantidade de meios utilizados para mantê-la fechada é muito esclarecedor quanto ao objectivo de proibir a sua transposição. No entanto, há no topo uma rede que permite ver o que há lá dentro... É no momento em que me aproximo desta porta que oiço uns ruídos estranhos que vêm do interior da casa e que me fazem arrepiar. Identifico o som do bater das asas de aves e isso sossega-me o espírito. Do que consigo ver, do ponto onde espreito para o interior da casa, confirmo a existência de alguns pombos (ou rolas?). Ainda assim ficaram outros sons por identificar…
Acabo de contornar a casa e encontro no seu topo norte, em frente a uma das janelas fechadas, uma "instalação rudimentar" que, deduzo, servirá de poiso para os pombos. Naquela janela há um pequeno orifício por onde os pombos entrarão - continuo no plano das deduções - e sairão? Esta é a primeira de muitas questões que me surgiram repentinamente. Quem (e para quê) construiu esta "engenhoca"? Porque só os acessos ao piso inferior estão fechados (e parecem-me recente e propositadamente bem fechados)? Se os bocados de carne e as penas que tinha visto no anexo eram de um ou mais pombos, onde estão as brasas onde, supostamente, foram assados? Mas lembrei-me entretanto de que os pedaços de pombo que estavam em cima daquela telha pareciam-me crus. Então se não seriam para comer, para que servirão?... O som que saía do orifício era demasiado assustador para me aproximar dele. Continuo a ouvir os pombos, ouvia a corrente de ar que entrava e saía por aquele pequeno rectângulo negro, mas há mais qualquer coisa que continuo a não identificar. Estou ligeiramente assustado para prosseguir com a "investigação" e decido abandonar o local.
Regresso ao caminho, tiro mais umas fotos e faço, bem mais tranquilo, a minha viagem de regresso. Ainda assim, não deixo de continuar a pensar em todas as questões e possibilidades relativas aos recentes acontecimentos desta casa. São pensamentos que me sobressaltaram nas horas seguintes aquela visita e que por vezes me vêm à mente. O mesmo acontece com a magnífica vista daqueles quartos...
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